quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

EM CONCURSO PÚBLICO A APROVAÇÃO É SÓ COMEÇO - UMA CRÍTICA A FASE OBJETIVA DOS CONCURSOS.


EM CONCURSO PÚBLICO A APROVAÇÃO É SÓ COMEÇO  - UMA CRÍTICA A FASE OBJETIVA DOS CONCURSOS.


Rogério Montai de Lima
Magistrado e Professor
Doutorando em Direito Público pela UNESA/RJ

Não há dúvidas de que, dentre as formas existentes de escolha de candidatos para provimento de vagas no serviço público, o concurso público é a menos pior. Nem consigo (ou consigo) imaginar como seria se o administrador público pudesse, por critérios em sua maioria subjetivos, escolher aquele que (ele) entendesse melhor preparado.
Se não há opção, o melhor que temos a fazer é aperfeiçoar esse “sistema” de escolha de candidatos denominado concurso público. Existem preocupações louváveis, especialmente do CNJ e do CNMP que editaram resoluções visando uniformizar os critérios dos concursos para ingresso nas carreiras da magistratura e do ministério público, mas acredito que muito ainda possa melhorar.
Notem o exemplo da primeira fase em forma de questões objetivas (geralmente em número de 100), obrigatória nestes moldes conforme prevê as resoluções dos órgãos de controle acima citados. Nesta fase pelo menos 70 ou 80% (para ser otimista) dos candidatos já derrapam. Se não bastasse terem de alcançar um patamar mínimo de acertos (na maioria 60%), ainda são obrigados a, pelo menos, empatar com a nota de corte de um limite de aprovados naquela fase imposto no edital. Já vi provas objetivas para a magistratura em que a nota de corte foi 81 pontos de 100 questões. Até aqui sem problemas, embora difícil, limitar aprovados é normal. Minha crítica se dá na forma em que as questões objetivas estão sendo formuladas.
Encontro dois problemas na forma como estas questões objetivas estão sendo apresentadas.
A primeira delas é que por falta de tempo ou preguiça do examinador, as questões objetivas, não raras vezes, são mal formuladas. Já perdi a conta de quantas questões cobraram prazos, por exemplo, em concursos da magistratura ou ministério público. Outro problema é a exigência, cada vez mais, de questões com alternativas que apresentam o texto “seco” da lei.
O que e quem avalia exigir legislação “seca” ou cobrar prazos em questões objetivas? Nada e ninguém.
Queremos decoradores de texto para julgar nossos processos?
O problema é que concurso público virou indústria e geralmente o examinador (em especial o remunerado só para esta tarefa  - de “criar” perguntas) não tem mais tempo de formular uma questão, mesmo que objetiva, e que de fato avalie o candidato. Para o examinar é mais fácil abrir o código e escolher qual artigo, parágrafo, inciso ou alínea vai inserir na questão. Ainda, também é fácil, e isso virou moda, extrair questões do clipping de notícias dos tribunais superiores. Se esta escolha fosse, ao menos, somente dos informativos das cortes seria bem melhor. Aliás, ler e conhecer informativos é muito importante não só para o concurseiro, mas para qualquer um.
Nem vou discutir aqui a criação diária de princípios, teses, teorias e conceitos jurídicos – outro problema, eis que isso é também exigido nos concursos. 
O problema é que “o que estudar” nunca diminui, ao contrário, aumenta diariamente diante de tanta criatividade e que, não tem jeito, compramos a idéia. Devemos ser o maior importador do mundo de conceitos e teorias jurídicas.
É claro que cobrar texto seco de lei tem um propósito. Facilita a vida do examinador e evita a Judicialização do concurso. Como questionar quando se cobra alternativas idênticas aos dispositivos dos códigos e das leis?
Se não podemos fugir das questões objetivas, que elas sejam ao menos, bem elaboradas.
Minha sugestão é que todas as questões objetivas sejam apresentadas em forma de problemas e relacionadas à área de atuação do cargo em disputa. Formula-se a hipótese problemática e as alternativas sejam todas relacionadas à como resolver juridicamente (ou não, no caso de se perguntar o que jamais deveria ser feito) o impasse.  
Repito – formular questões assim é muito mais difícil. Que examinador teria tempo para preparar questões dessa natureza? Mas muito melhor.
Houve época em que o TJ/RJ (e a maioria dos concursos daquele Estado), ao invés de questões objetivas, previa em sua primeira fase, questões subjetivas, salvo engano umas vinte.  Sempre achei interessante.
Não tenho a menor dúvida que o candidato é muito melhor avaliado quando escreve ou discorre sobre um assunto do que quando faz um “x” ou pinta uma bolinha, escolhendo uma alternativa.  É na fase discursiva, em uma sentença, na elaboração de uma ação ou parecer, que o candidato mostra o seu valor. A dificuldade do concurso deve se concentrar mais nessa fase e não eliminar multidões na primeira fase apenas para facilitar o desenrolar do certame com menos candidatos para administrar.
Tenho tantos amigos ou conhecidos, vocacionados, inteligentíssimos, escritores, humanistas, que certamente seriam grandes juízes ou membros do MP, mas que jamais foram aprovados em uma primeira fase por não terem a aptidão para decorar e, assim, acabaram desistindo. Outros foram injustiçados na criticada fase oral, que não minha concepção também deveria ser usada para questionar posições jurídicas diante de situações problemáticas em casos hipotéticos, mas que também, muitas vezes, é usada da mesma forma como a fase objetiva.
Se não bastassem todas as dificuldades encontradas durante as fases do certame, a aprovação em concurso é só começo.
A maioria dos concursos, especialmente os da carreira da magistratura, ministério público, procuradorias, delegados de polícia ou federal ou defensorias, dificilmente encerram-se em menos de um ano. Logo a dedicação tem duração elástica. Isso ocorre pois os editais estipulam uma infinidade de fases para estes concursos e ainda, respeita-se os prazos para correção, recursos, habilitação, classificação e tempo razoável de uma prova para outra.
Outro problema gravíssimo enfrentado nos concursos públicos é a Judicialização de praticamente todas as fases. Tudo é questionado hoje em dia e a jurisprudência tem acolhido boa parte das reclamações, o que encoraja ir à juízo (e isso é bom, claro). Resultado disso é que todos devem aguardar o resultado dos julgamentos. Quando não é o judiciário quem determina é a própria comissão do concurso que suspende o certame até a regularização. Há abuso, vício, irregularidades em concursos por parte da banca? Claro, mas é preciso encontrar uma outra forma de resolver os problemas ao invés de, quase sempre, só suspender. Isso é um martírio para qualquer candidato. Que tal, quando der,  e se oc aso, prosseguir o concurso reservando a vaga de quem judicializou?
Mesmo após o resultado definitivo e homologado o concurso, ainda assim, a posse não é garantida. Conheço muitos casos de quem ganha mais não leva. Casos de quem é aprovado e aguarda anos para a posse ou até mesmo exemplos em que esse momento nunca tenha chegado também não são raros.
O problema orçamentário também tendo sido frequente e deixar de dar posse pelo fato de não haver recurso em caixa é cada vez mais comum. Acredito que qualquer administrador, presidente de tribunal, defensor geral ou procurador geral de justiça ou da república, gostaria de dar posse aos aprovados. É óbvio - seria bom pra todo mundo. A questão é orçamentária. É claro que há casos de má gestão, ineficiência ou incompetência, mas acredito que essas hipóteses são excepcionais.
Não é fácil mas ainda assim é preciso acreditar e fazer a sua parte. O momento vai chegar e temos de saber lidar com tudo isso.
Depois de aprovado ... ah, depois de aprovado (...) isso é uma outra história!
Só pra ficar bem claro, quem assina este texto não é alguém frustrado por não ter sido aprovado e, assim, crítico do sistema. É exatamente o contrário – fui aprovado no concurso da magistratura e passei por todas essas dificuldades – as superei e posso dizer que valeu muito a pena.
Um abraço

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