terça-feira, 6 de março de 2012

Tiras de Processo Penal 2 - Testemunha e simples ratificação em juízo do depoimento na fase policial - Nulidade segundo o STJ

A regra é a de que a testemunha fará, sob palavra de honra, a promessa de dizer a verdade do que souber e lhe for perguntado, bem como relatar o que souber, explicando sempre as razões de sua ciência ou as circunstâncias pelas quais possa avaliar-se de sua credibilidade.
Nos termos do artigo 204 do Código de Processo Penal, o depoimento será prestado oralmente, não sendo permitido à testemunha trazê-lo por escrito, não sendo vedada à testemunha, entretanto, breve consulta a apontamentos.
Já se sabe que as provas produzidas em inquérito policial e não ratificadas em juízo, sem o crivo do contraditório judicial, não podem fundamentar decreto condenatório, conforme dispõe o art. 155, 'caput', do CPP (Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.).

Assim, outro ponto relacionado e importante que merece destaque é a maneira pela qual o magistrado efetua a oitiva de testemunhas, ou seja, a forma como a prova ingressa nos autos. Uma maneira muito comum na prática forense, sobretudo, justificada (até então) pela infinidade de audiências designadas para o mesmo dia e buscando agilidade e economia de tempo, é a que o magistrado somente faz a leitura dos depoimentos prestados perante a autoridade policial, questionando a testemunha se ela ratifica tais declarações.

Referida prática foi considerada ilegal no julgamento do HC 183.696/ES de Relatoria da Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 14/2/2012. No referido julgado foi concedida a ordem para anular a ação penal a partir da audiência de testemunhas de acusação, a fim de que seja refeita a colheita da prova testemunhal, mediante a regular realização das oitivas, com a efetiva tomada de depoimento, sem a mera reiteração das declarações prestadas perante a autoridade policial. Note-se:


A discussão diz respeito à maneira pela qual o magistrado efetuou a oitiva de testemunhas de acusação, ou seja, a forma como a prova ingressou nos autos. Na espécie, o juiz leu os depoimentos prestados perante a autoridade policial, indagando, em seguida, das testemunhas se elas ratificavam tais declarações. O tribunal a quo afastou a ocorrência de nulidade, por entender que a defesa encontrava-se presente na audiência na qual teve oportunidade para formular perguntas para as testemunhas. Nesse panorama, destacou a Min. Relatora que, segundo a inteligência do art. 203 do CPP, o depoimento da testemunha ingressa nos autos de maneira oral. Outrossim, frisou que, desse comando, retiram-se, em especial, duas diretrizes. A primeira, ligada ao relato, que será oral, reforçado, inclusive, pelo art. 204 do CPP. A segunda refere-se ao filtro de fidedignidade, ou seja, ao modo pelo qual a prova ingressa nos autos. Dessa forma, ressaltou que a produção da prova testemunhal, por ser complexa, envolve não só o fornecimento do relato oral, mas também o filtro de credibilidade das informações apresentadas. In casu, tal peculiaridade foi maculada pelo modo como empreendida a instrução, na medida em que o depoimento policial foi chancelado como judicial com uma simples confirmação, não havendo como, dessa maneira, aferir sua credibilidade. Assim, concluiu não se mostrar lícita a mera leitura do magistrado das declarações prestadas na fase inquisitória, para que a testemunha, em seguida, ratifique-a. Com essas, entre outras considerações, a Turma, prosseguindo o julgamento, concedeu a ordem para anular a ação penal a partir da audiência de testemunhas de acusação, a fim de que seja refeita a colheita da prova testemunhal, mediante a regular realização das oitivas, com a efetiva tomada de depoimento, sem a mera reiteração das declarações prestadas perante a autoridade policial. Precedentes citados do STF: HC 75.652- MG, DJ 19/12/1997, e HC 54.161-RJ, DJ 22/4/1976. HC 183.696-ES, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 14/2/2012.

Referida prática é bastante utilizada na oitiva de policiais onde muitas vezes, diante dos vários casos em que atuam, acabam por não se lembrar com detalhes do caso em análise. Uma maneira de solucionar a questão é agilizar o andamento do feito judicial, a fim de que a instrução ocorra o mais rápido possível, quando ainda presente na memória das testemunhas os fatos discutidos.

Lembrando que a oitiva prestada por testemunha policial (não contraditada), quando em sintonia com as provas do processo, é merecedora de fé eis que originária de agente público no exercício de sua função. Assim, os depoimentos dos policiais, quando fortalecidos por outras provas, valem como prova. O Supremo Tribunal Federal é firme que “a simples condição de policial não torna a testemunha impedida ou suspeita” (HC 70237, DJ 08/04/94 p. 228, STF- 1ª Turma, Relator o Ministro Carlos Velloso).

Não existe nulidade se a condenação está fundamentada em outros elementos válidos, não apenas no depoimento da vítima, colhido ainda na fase do inquérito policial, não ratificado em juízo (STJ – HC 200602830110 – (73385) – SP – 5ª T. – Relª Min. Laurita Vaz – DJU 17.12.2007 – p. 00244).  
Para finalizar, ainda, é importante dizer que pequenas divergências entre oitivas prestadas por testemunha na fase policial e em juízo não deslustra o conjunto probatório dos autos.

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