EM CONCURSO
PÚBLICO A APROVAÇÃO É SÓ COMEÇO - UMA CRÍTICA
A FASE OBJETIVA DOS CONCURSOS.
Rogério Montai
de Lima
Magistrado e Professor
Doutorando em Direito Público pela UNESA/RJ
Página no Facebook: http://www.facebook.com/pages/Rogerio-Montai-de-Lima/249422328429638
Não há dúvidas
de que, dentre as formas existentes de escolha de candidatos para provimento de
vagas no serviço público, o concurso público é a menos pior. Nem consigo (ou
consigo) imaginar como seria se o administrador público pudesse, por critérios
em sua maioria subjetivos, escolher aquele que (ele) entendesse melhor
preparado.
Se não há opção,
o melhor que temos a fazer é aperfeiçoar esse “sistema” de escolha de
candidatos denominado concurso público. Existem preocupações louváveis,
especialmente do CNJ e do CNMP que editaram resoluções visando uniformizar os
critérios dos concursos para ingresso nas carreiras da magistratura e do ministério
público, mas acredito que muito ainda possa melhorar.
Notem o
exemplo da primeira fase em forma de questões objetivas (geralmente em número
de 100), obrigatória nestes moldes conforme prevê as resoluções dos órgãos de
controle acima citados. Nesta fase pelo menos 70 ou 80% (para ser otimista) dos
candidatos já derrapam. Se não bastasse terem de alcançar um patamar mínimo de
acertos (na maioria 60%), ainda são obrigados a, pelo menos, empatar com a nota
de corte de um limite de aprovados naquela fase imposto no edital. Já vi provas
objetivas para a magistratura em que a nota de corte foi 81 pontos de 100 questões. Até aqui sem problemas, embora difícil, limitar aprovados é normal. Minha crítica se dá na forma em que as questões objetivas estão sendo formuladas.
Encontro dois
problemas na forma como estas questões objetivas estão sendo apresentadas.
A primeira
delas é que por falta de tempo ou preguiça do examinador, as questões objetivas,
não raras vezes, são mal formuladas. Já perdi a conta de quantas questões cobraram
prazos, por exemplo, em concursos da magistratura ou ministério público. Outro
problema é a exigência, cada vez mais, de questões com alternativas que
apresentam o texto “seco” da lei.
O que e quem
avalia exigir legislação “seca” ou cobrar prazos em questões objetivas? Nada e
ninguém.
Queremos
decoradores de texto para julgar nossos processos?
O problema é
que concurso público virou indústria e geralmente o examinador (em especial o
remunerado só para esta tarefa - de “criar”
perguntas) não tem mais tempo de formular uma questão, mesmo que objetiva, e que
de fato avalie o candidato. Para o examinar é mais fácil abrir o código e
escolher qual artigo, parágrafo, inciso ou alínea vai inserir na questão. Ainda,
também é fácil, e isso virou moda, extrair questões do clipping de notícias dos
tribunais superiores. Se esta escolha fosse, ao menos, somente dos informativos
das cortes seria bem melhor. Aliás, ler e conhecer informativos é muito importante não só para o concurseiro, mas para qualquer um.
Nem vou
discutir aqui a criação diária de princípios, teses, teorias e conceitos jurídicos
– outro problema, eis que isso é também exigido nos concursos.
O problema é que “o
que estudar” nunca diminui, ao contrário, aumenta diariamente diante de tanta
criatividade e que, não tem jeito, compramos a idéia. Devemos ser o maior importador
do mundo de conceitos e teorias jurídicas.
É claro que
cobrar texto seco de lei tem um propósito. Facilita a vida do examinador e evita a Judicialização do
concurso. Como questionar quando se cobra alternativas idênticas aos
dispositivos dos códigos e das leis?
Se não
podemos fugir das questões objetivas, que elas sejam ao menos, bem elaboradas.
Minha
sugestão é que todas as questões objetivas sejam apresentadas em forma de
problemas e relacionadas à área de atuação do cargo em disputa. Formula-se a
hipótese problemática e as alternativas sejam todas relacionadas à como
resolver juridicamente (ou não, no caso de se perguntar o que jamais deveria
ser feito) o impasse.
Repito –
formular questões assim é muito mais difícil. Que examinador teria tempo para preparar
questões dessa natureza? Mas muito melhor.
Houve época
em que o TJ/RJ (e a maioria dos concursos daquele Estado), ao invés de questões
objetivas, previa em sua primeira fase, questões subjetivas, salvo engano umas
vinte. Sempre achei interessante.
Não tenho a
menor dúvida que o candidato é muito melhor avaliado quando escreve ou discorre
sobre um assunto do que quando faz um “x” ou pinta uma bolinha, escolhendo uma
alternativa. É na fase discursiva, em
uma sentença, na elaboração de uma ação ou parecer, que o candidato mostra o
seu valor. A dificuldade do concurso deve se concentrar mais nessa fase e não
eliminar multidões na primeira fase apenas para facilitar o desenrolar do
certame com menos candidatos para administrar.
Tenho tantos
amigos ou conhecidos, vocacionados, inteligentíssimos, escritores, humanistas, que
certamente seriam grandes juízes ou membros do MP, mas que jamais foram
aprovados em uma primeira fase por não terem a aptidão para decorar e, assim,
acabaram desistindo. Outros foram injustiçados na criticada fase oral, que não
minha concepção também deveria ser usada para questionar posições jurídicas diante
de situações problemáticas em casos hipotéticos, mas que também, muitas vezes, é
usada da mesma forma como a fase objetiva.
Se não
bastassem todas as dificuldades encontradas durante as fases do certame, a aprovação em concurso é só começo.
A maioria
dos concursos, especialmente os da carreira da magistratura, ministério público,
procuradorias, delegados de polícia ou federal ou defensorias, dificilmente
encerram-se em menos de um ano. Logo a dedicação tem duração elástica. Isso
ocorre pois os editais estipulam uma infinidade de fases para estes concursos e
ainda, respeita-se os prazos para correção, recursos, habilitação, classificação
e tempo razoável de uma prova para outra.
Outro
problema gravíssimo enfrentado nos concursos públicos é a Judicialização de
praticamente todas as fases. Tudo é questionado hoje em dia e a jurisprudência
tem acolhido boa parte das reclamações, o que encoraja ir à juízo (e isso é bom, claro). Resultado disso é que todos devem aguardar o resultado dos
julgamentos. Quando não é o judiciário quem determina é a própria comissão do
concurso que suspende o certame até a regularização. Há abuso, vício, irregularidades
em concursos por parte da banca? Claro, mas é preciso encontrar uma outra forma
de resolver os problemas ao invés de, quase sempre, só suspender. Isso é um
martírio para qualquer candidato. Que tal, quando der, e se oc aso, prosseguir o concurso
reservando a vaga de quem judicializou?
Mesmo após o resultado
definitivo e homologado o concurso, ainda assim, a posse não é garantida. Conheço
muitos casos de quem ganha mais não leva. Casos de quem é aprovado e aguarda
anos para a posse ou até mesmo exemplos em que esse momento nunca tenha chegado
também não são raros.
O problema
orçamentário também tendo sido frequente e deixar de dar posse pelo fato de não haver
recurso em caixa é cada vez mais comum. Acredito que qualquer administrador,
presidente de tribunal, defensor geral ou procurador geral de justiça ou da república,
gostaria de dar posse aos aprovados. É óbvio - seria bom pra todo mundo. A questão é orçamentária. É claro que há casos de má gestão, ineficiência ou
incompetência, mas acredito que essas hipóteses são excepcionais.
Não é fácil
mas ainda assim é preciso acreditar e fazer a sua parte. O momento vai chegar e
temos de saber lidar com tudo isso.
Depois de
aprovado ... ah, depois de aprovado (...) isso é uma outra história!
Só pra ficar
bem claro, quem assina este texto não é alguém frustrado por não ter sido aprovado e, assim, crítico
do sistema. É exatamente o contrário – fui aprovado no concurso da magistratura
e passei por todas essas dificuldades – as superei e posso dizer que valeu
muito a pena.
Um abraço
O tema em questão parece ser igual a uma pergunta que vez por outra chega até nós: Voc~e já foi entrevistado por um ressenceador do IBGE? A resposta é quse sempre, não. A pergunta com relação ao tema em questão seria: Voc~e conhece alguem que passou em um concurso e não foi chamado? Eu respondo que conheço vários, mas que no decorrer do tempo para alguns deram certo, mesmo algumas vezes buscando o caminho do judiciário.
ResponderExcluirDestaco do seu excelente texto: "Queremos decoradores de texto para julgar nossos processos?" - São tantas as interferências durante um concurso que nem sempre os aprovados são os mais indicados, de forma global, para a função.
ResponderExcluirProfessor, que texto maravilhoso! Nos leva à reflexão e identificação de vários pontos falhos neste "mundo" dos concursos. Concordo com grande parte do que foi exposto, e torço para que melhorias sejam feitas, tanto para ajudar o concurseiro, como para beneficiar a Administração Pública, que precisa tanto de bons funcionários (o que vai além da capacidade de decorar...). Acompanhei alguns trechos via twitter, mas valeu muito a leitura. Obrigada por compartilhar. Continuarei estudando e espero chegar lá! Abraços. @Van_Patricio
ResponderExcluirÓtimo texto. Parabéns.
ResponderExcluirRealmente, nota-se um grande descaso na formulação das questões. Creio que, enquanto esse quadro não for alterado, o jeito é se familiarizar com o modelo das questões o que só poderá ocorrer pela prática. Existe um novo sítio eletrônico voltado, dentre outros, para concurseiros. Trata-se de forum jurídico de perguntas e respostas onde compila-se questões de concursos públicos, algumas tais quais foram formuladas, a saber: http://www.perguntedireito.com.br
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